quinta-feira, 3 de fevereiro de 2011

A insustentável leveza do ser *


Eu tenho pensado, ultimamente, que uma das coisas mais difíceis num relacionamento é não confundir o que se quer com o que outro tem a oferecer, ou melhor, quer oferecer. Quando a gente faz isso, cria as famosas expectativas. No Aurélio, temos: expectativa. [Do lat. expectatu, ‘esperado’, + -iva.] S. f. Esperança fundada em supostos direitos, probabilidades ou promessas.
Achamos que outro tem que fazer determinadas coisas, pois supostamente (para nós, não para o outro) a situação chegou a um momento que requer algum tipo de tomada de decisão.
Quanta bobagem! E isso pesa. Claro, atire a primeira pedra quem nunca teve um surto de expectativas. Mas vamos nos colocar no lugar do outro. E mais, voltemos ao nosso lugar e vejamos até que ponto nós estamos administrando as coisas para alcançar o que desejamos. Nós supomos certas coisas, mas é possível ver o que existe de real e não se iludir.
Outro dia tive uma conversa bizarra com um cara. Nós tínhamos acabado de nos conhecer, e vai saber, podia até ser que algo surgisse desse encontro. Aí eu fiz a perguntinha básica: “E o que você gosta de fazer?”. Eis que o donzelo me responde: “Qualquer coisa acompanhado”.
O quê??? Como assim qualquer coisa? Eu sou meio doida, então insisti: “Mas o que exatamente? Balada, restaurante, viajar, show? Ele se manteve firme: “Qualquer coisa acompanhado”. Eu estava inconformada: “Mas que tipo de música você gosta?”. Ele: “Qualquer uma, desde que ouça acompanhado”.
Eu não agüentei, e comecei a rir... E depois expliquei que achava as respostas estranhas porque sempre gostamos de alguma coisa, de um estilo musical, um gênero de filme, montanha ou praia, salada ou junkie food, sei lá... As preferências fazem parte do ser humano, por mais flexível que alguém seja. E falei: “Bem, já deu..., to indo”. Por que eu fui fazer isso, meu pai?!? O cara não gostou nem um pouco... Quando dei por mim estava levando uma DR com um desconhecido! “Mas o que você quer? Você é imatura! Eu estou aqui à disposição e você só quer saber do que eu gosto???”
Ah, fofucho, fala com a minha mão. Eu ainda acredito em afinidades, em individualidade, em companheirismo, e não suporto dependência ou falta de personalidade. Não havia nada, e já havia expectativas, cobranças.
Socorro... Vamos fazer uma sociedade mais emocionalmente estruturada, estável, e livre? Podemos ir devagar? Acelerar quando der na telha? Mas sempre conscientes de quem somos? Sei que podemos!
Obrigada!
******
* A insustentável leveza do ser é o título de um livro de Milan Kundera (1984), autor tcheco que entre outras obras escreveu o ótimo A brincadeira. A história acontece em Praga e em Zurique, em 1968, e atravessa algumas décadas. Narra os amores e os desamores de quatro pessoas: Tomás, Teresa, Sabina e Franz. É permeada pela invasão russa à Tchecoslováquia e pelo clima de tensão política que pairava na Praga daqueles dias.
O livro foi adaptado ao cinema, com o mesmo título, pelo diretor Philip Kaufman.

Nenhum comentário:

Postar um comentário