segunda-feira, 13 de agosto de 2012

Índia, terceiras impressões


Quinta-feira, dia 9.
De malas prontas, vamos à última mesa redonda da conferência, que discute situação da classificação hoje em dia. O antigo e o moderno ressaltam aos olhos: americanos e alemães parados no tempo, singapuranos e outros americanos antenados com o que ocorre no mundo.
Retiramos nosso pôster, voltamos ao hotel e fazemos nosso último almoço em Mysore, enquanto aguardamos o carro que nos levará ao aeroporto de Bangalore. Meu destino: Agra.

1º. Trecho, 4h30 de carro
Sair de Mysore, ir a Bangalore, e cruzar um monte de cidadezinhas. Essa é a viagem por paisagens que, quando eu cheguei não vi pois era madrugada. Desta vez deixamos o hotel meio-dia e meia. Somos cinco passageiros e as malas que acabam sendo levadas no teto,  presas por uma singela cordinha – de acordo com o pessoal do hotel, a última palavra em segurança no envio de bagagens. Tudo iria bem se não fosse a chuva. A Índia está no período das monções, e por isso toda hora chove. E as malas dos meus colegas se molham. A minha, que estava por baixo, foi poupada.
A paisagem é desoladora: gente pobre, sujeira, vacas comendo lixo, pessoas lavando pratos e panelas na rua. Trânsito e muita buzina. Onde está a famosa espiritualidade indiana?
Chegamos ao aeroporto a tempo para todos, tomamos um chá, e vemos as lojinhas. Check in feito, procuro wi-fi. Consigo uma rede que libera 45 minutos gratuitamente, e aproveito para avisar ao motorista que deve me pegar em Delhi, que somente chegaremos depois das onze e meia. O tempo acaba e não recebo respostas. Espero que dê certo.

2º. Trecho, 2h30 de avião
Com 40 minutos de atraso, embarcamos num avião da Kingfisher (mas isso não é marca de cerveja indiana?). Um guarda de turbante verifica nossas bagagens de mão, antes de entrarmos na aeronave. Para meu espanto, as poltronas são largas, a temperatura é agradável e é servido jantar. Aproveito para dormir um pouco.
Chegamos quase meia-noite, e meu celular toca. Alguém avisando que o motorista já está nos aguardando. Rapidamente pegamos nossas malas. No banheiro, uma indiana abre a porta para nós, abre a torneira, põe sabão nas nossas mãos, e nos entrega a toalha – quer gorgeta. Visualizo o que me aguarda em Agra.
Saímos do aeroporto, e o tal motorista já correndo em nossa direção. Trata-se de um homem bastante simpático e gentil (estamos mesmo na Índia).

3º. Trecho, 3h carro
Deixamos o aeroporto. O motorista nos diz que ainda teremos 4h30 de viagem até Agra. Mas, para nossa alegriaaaa, acaba de ser inaugurada uma Expressway, uma rodovia de alta-velocidade que promete nos levar à Agra em até duas horas. E para nossa sorte, em seus primeiros dias de funcionamento, não são cobradas as taxas de pedágio. Eba!
De fato vamos rápido e com conforto. O simpático taxista nos mostra um pouco de Delhi a noite. Essa sim parece uma cidade grande, desenvolvida. Bate um alívio, um sentimento de esperança para a Índia. O problema é quando chegamos em Agra. O passado se apresenta na sua pior forma. E cadê o nosso hotel. Rodamos por mais de meia hora, e nada. Ligamos e nada. Após vários pedidos de informação encontramos o endereço.

Onde estamos?
O carro para, numa travessa no meio do nada. Trata-se de uma casa escura. Batemos, o motorista continua telefonando em hindu. Quinze minutos depois a luz interna se acende, e vemos, através da porta de vidro, uma sala com um colchão no chão, onde alguns indianos dormem. Eu e Nair olhamos uma para cara da outra. Não vai rolar.
O motorista percebe nossa aflição (ele realmente nasceu em Delhi, como nos contou?), e diz que conhece uns hoteis melhores na região. Seguimos viagem. Ele nos mostra algo como muito chique, e enfim nos leva a algo não tão caro assim. Informa aos funcionários que queremos olhar o quarto antes de decidir. O que fazemos, mas estamos tão cansadas que ao vermos a cama e o banheiro, aceitamos na hora o negocio.
O que foi uma besteira. O chuveiro não tinha água suficiente, apenas umas gotas, mas na banheira sai água em abundancia. Portanto, banhos de canequinha, e cabelos lavados na pia.
Mal terminamos de nos instalar no quarto, e batem na porta. É o recepcionista pedindo a gorjeta, as quatro da manhã. Achei o fim: não dava para esperar nos descansarmos um pouco? Antes dele, o rapaz que nos trouxe água também ficou estendendo sua mão. E para piorar, descobrimos que o café da manhã é duvidoso, e comemos apenas um pão, e um chá numa louça que não vai ganhar o premio de mais limpa do mundo.

Monumentos de Agra
Como de sexta-feira o Taja Mahal fica fechado, preenchemos nosso roteiro com visitas a outros templos e atrações. Nosso motorista chega pontualmente ao meio dia, e para nossa surpresa, vem acompanhado de outro homem. Mr. Giall, nosso motorista, o apresenta como um guia que fala espanhol. Ficamos pasmas, afinal não nos lembrávamos de ter solicitado nenhum serviço desse tipo.
E começam as perguntas: o que fazem, quais são os membros da família que vivem com você, filhos, quando volta para Portugal? Minha resposta: sou estudante, recém-casada sem filhos, e vivo no Brasil. Olho feio e as perguntas param por aí.
Passmos pelo rio Yamuna, e no centro caótico, pobre, sujo, vemos os macacos. E eles não estão sós: cabras, porcos, cavalos, cães e vacas. Todos na maior imundície. E começa a visitação: primeiro Mehtab Bagh, um jardim maravilhoso que faz vista para o Taj Mahal, vamos ao Itmad-ud-Daulah, que é um tumulo, uma espécie de mini Taj, e Chini Ka Rauza, outro túmulo, mas em estilo chinês. Tudo isso sob um calor escaldante.
Aí o guia, apesar de nossos protestos, nos leva a um fabricante de tapetes. Ele nos mostra todo o processo artesanal – enquanto fala, homens franzinos e mal tratados, com aparência de escravos, fazem movimentos coordenados com a explicação do marajá dos tapetes. É muita exploração do ser humano.
Saímos de mãos vazias e vamos almoçar num restaurante indicado por Mr. Giall. Vou lavar as mãos e um rapaz faz questão de abrir a torneira para mim, colocar o sabão nas minhas mãos e me entregar as toalhas – claro, quer gorjeta. Até pensei em usar o banheiro, mas eram tantas as moscas voando que desisto da ideia.

Salvação do dia
Ah, o almoço. Delicioso, divino! Ah se a Índia fosse como esse almoço... Comida quase sem pimenta, saborosa, bom atendimento. Mas não aceita cartão. Nem tudo é perfeito.

Mais atrações
Terminamos o passeio com o Agra Fort. Trata-se de um palácio belíssimo e imenso que foi casa de um imperado da India. Lá viviam ele, suas três esposas, filha, e mais de 600 concubinas. A função delas era cuidar do serviço domestico e sexual do imperador.  
Mais uma vez uma família indiana que não fala inglês pede para tirar fotos comigo. Vai entender, estamos num templo maravilhoso, no qual ao fundo se vê o Taj Mahal, mas é de mim que querem tirar fotos.
Exaustas, somos levadas de volta ao hotel no final da tarde. Afinal ainda teremos o desafio do banho.

Taj Mahal
De malas prontas, fazemos o check out do hotel e vamos ao Taj Mahal.
Descobrimos que a entrada custa 750 rupias (dos outros monumentos varia de 100 a 300) e ainda temos de pagar o transporte de um portão até o templo, num carro elétrico, pois, carros convencionais não entram para evitar a poluição e não sujar o templo de mármore.
Fico brava, o guia diz que não é culpa dele. Eu sei, é da agência de viagens que não avisou dos custos extras, é do governo, é da India, é minha de quando quis fazer essa viagem. Mas ok. O Taj Mahal é uma coisa inexplicável, maravilhosa – realmente vale a pena a visita.
Após a visita, pagamos o guia (300 rupias por monumento visitado), e o motorista nos leva a um fabricante de mármores incrustados com pedras preciosas. Novamente, uma aula de arte, diante de semi-escravos bem ensaidos.

Delhi
Antes de nos deixar no aeroporto,  Mr. Giall nos surpreende com um city tour pela sua cidade natal. E não é que a Índia tem um lugar mais agradável? Delhi é a capital, muitos casarões para políticos e embaixadas, parques. Claro que se você desce do carro, aparecem milhões de indianos querendo vender alguma coisa. Mas o super Mr. Giall os avisa para não nos pressionar. Pelo menos ele entendeu que não somos o tipo de turista que consome desenfreadamente.
Mesmo assim, é impossível esquecer a miséria. A cada farol em que paramos, crianças batem nos vidros do carro pedindo comida, dinheiro, querendo vender alguma coisa. Novamente, cadê a espiritualidade?
Mr. Giall compra uma lembrancinha religiosa, conta que é muito pobre, mas parece feliz e conformado. Sabe que nunca sairá da Índia, pois nunca terá dinheiro para pagar uma passagem. Não recebeu educação, sabe inglês por conta própria. E agradece ao grande Lorde Krishna por tudo.
Chegamos ao aeroporto. A Índia está chegando ao fim.

Delhi, 11 de agosto de 2012.

4 comentários:

  1. Michely, que barra!!! Uma experiÊncia e tanto!
    bj
    marilda

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    1. Com certeza, Marilda!
      A experiência valeu mesmo - mas acho que não volto lá não, rsrsrsr.
      Bjs

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  2. Oi!

    Tenho um amigo indiano, que mora na Califórnia. Se um dia eu for à Índia, vou querer ir com ele.
    Consigo ver as imagens com clareza (será que todo jogador tem essa facilidade??) e só de pensar em tantas horas para chegar em algum lugar, estou morrendo de orgulho de vc, Mi!

    O seu paladar nunca mais será o mesmo.
    boa viagem de volta e seja bem vinda!

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